Fernanda Câncio, “Artur e os outros burlões”
in Diário de Notícias, hoje
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Onde estavam os jornalistas económicos quando PSD e CDS juravam que, uma vez no poder, bastaria "cortar no supérfluo" e nada de aumentar impostos, nada de fechar centros de saúde, escolas, racionalizar o Estado, tudo isso que o Governo anterior fazia, claro, por pura maldade? E onde estão agora, que até o Pedro admite ser a generalidade da despesa do Estado com prestações e serviços sociais, os reconhecimentos de terem sido levados ao engano, os mea culpa por não terem feito "o trabalho de casa"? Onde estão as acusações de burla e os apodos de burlão a quem vendeu a história falsa?
Difícil encontrar hoje um analista ou jornalista que não faça pouco das previsões do Vitor, não é? Mas quem não se recorda de ter sido apresentado como "um técnico brilhante e apolítico", "uma infalível máquina de contas", e a sua austeridade como "o único caminho"? E já não se lembram de como o Pedro era "um homem sério", "sensato", "bem falante" (!), que "não enganava ninguém", e o Álvaro um brilhante académico que trazia do Canadá a saída para todos os problemas?
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[citação parcial]
* Também publicado em http://quadratim.blogspot.com
Hoje em dia já todo o cidadão comum viu que os políticos profissionais não são mais que falcatos, daqueles que nunca tiveram profissão, nem formação, nem méritos, nem escrúpulos. A maioria dos cidadãos comuns – aquela categoria que é mesmo o cidadão comum – tardou a descobrir essa realidade, afinal tão antiga como a História.
Mas não há fome que não dê em fartura: e o ‘povão’ que ontem vegetava no acriticismo indiferentista perante as hordas de espertos que ao chegar a hora de ficarem sem a semanada do papá já têm o futuro mais-que-prevenido por dúzias de bandeiras, emblemas, pins e auto-colantes da seita que os torna especialistas de qualquer coisa que é coisa nenhuma, esse mesmo ‘povão’ faz, hoje, uma pausa no frenesim futeboleiro e muda de bancada para clamar, proclamar e sentenciar que todo o cidadão pensante ou perguntante de Política é pela certa membro dessas associações de malfeitores que são os partidos, movimentos, grupos cívicos ou tertúlias filosóficas. O unanimismo abstencionista que ontem levou ao poder ‘sumidades’ como cavacos, coelhos e tozés rumou hoje em procissão ao totem do “eles são todos iguais”.
Só ninguém diz que à cabeça dessa procissão vão, precisamente, os sacerdotes do novo catecismo. E poucos notam que na ladainha há, por cada sacerdote, um fiel séquito de sacristães livres de paramentos mas sempre prontos a preparar, abrir, adornar e limpar o caminho da procissão que a cada quatro anos redescobre os demónios - e a urgente exorcização. Até que chegue (de novo) a hora de abrenunciarem. A benefício do novo conclave. Ou à espreita da sua própria sotaina.
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