A União Soviética é o único país no Mundo..., em que o passado é imprevisível. — Anedota soviética, dos tempos da Perestroika
Se eu tivesse um pingo de juízo, não em envolvia em mais uma polémica a respeito das terras do Levante. Mas como continuo a ter tão pouco como aquando das anteriores, aqui vai! Comecemos pelas imagens.
Algum tempo atrás, lancei uma provocação a um amigo de muitas décadas, historiador e fotógrafo, com trabalho de investigação publicado a respeito da fotografia como documento histórico. Disse-lhe: "Toda a imagem digital é arte abstracta". Não vou reproduzir aqui a amena e interessante cavaqueira, a que outros participantes adicionaram desde o estruturalismo a uma larga panóplia de muitas correntes do pensamento humano durante o último século. Vou repetir a minha afirmação original, mas agora em termos mais claros e assertivos:
Toda a fotografia digital é arte abstracta, e esta arte liberta-nos da tirania das ilusões naturalistas que foram construídas desde Niepce atá à última década do século XX; liberta-nos da tirania da fotografia como deus ex machina, um deus que fala por intermédio duma máquina, e devolve-nos ao mais humano da nossa natureza e da nossa memória, edificada a partir do testemunho de outros seres humanos. A fotografia digital é apenas, e em toda a maravilha das narrativas humanas, o testemunho do seu autor. Assim se fez a Ilíada, assim foram escritas as Crónicas de Gilgamesh. Viva a fotografia digital, incluindo — mas obviamente, não limitado a — manipulação de fotografias digitais!
Agradeço encarecidamente os comentários ao meu post anterior, em particular, o link para o que será, eventualmente, a origem de pelo menos parte da imagem que eu publiquei. Aqui fica, com link directo para a fonte, e aqui fica o título que o narrador lhe deu: "Victims of drone", "Vítimas de drone".
Mas vejamos então aquele epítome do Inferno chamado Gaza, e vejamos a imagem original, tal como narrada pela OCHA (United Nations Office for the Coordination of Humanitarian Affairs). O original está aqui, o que segue são alguns recortes. Alguns recortes do Inferno.
Caro leitor, o que chamaria a um pedaço de terra do qual apenas uma ínfima minoria dos seus habitantes consegue sair? Prisão, provavelmente. Eu também, por isso, eis a primeira legenda nesta narrativa: Prisão.
Mas, no fim de contas, a Faixa de Gaza fica nas costas do Mediterrâneo, certo? E as populações costeiras sempre encontraram no mar uma fonte importante de receitas e de comida. Ou não? Eis a segunda legenda: Bloqueio.
E se não tivéssemos como tratar os resíduos que as nossas sociedades produzem? Como o descreveríamos numa única palavra? Escolhi um termo bíblico: Peste.
Há quantos milhares de anos é que a Humanidade se alimenta da agricultura? Muitos, mas..., que nome daríamos a um conjunto de circunstâncias que impede as populações locais de usarem até o pouco terreno agrícola disponível? Escolhi o mais directo: Fome.
Mas alguma coisa aquela gente há-de produzir. E o que eles produzem, outros hão-de necessitar e hão-de querer comprar. Se os deixarem, claro. Que nome daremos a essa negação? Esta é uma escolha asseguradamente consensual: Roubo.
Nunca houve nenhuma prisão perfeita. Muitos tiranos tentaram e todos falharam. Mas o que é que os habitantes duma prisão procuram? Aquilo que não têm, claro. E o que será que os habitantes dessa prisão mais desejam? Manteiga ou canhões? Tão humano como caminhar em posição erecta, é o desejo de responder à violência com violência. Eis a legenda: Armamento.
E eis o mapa do Inferno, acompanhado das legendas que o descrevem: Prisão, Bloqueio, Peste, Fome, Roubo e Armamento.
Provavelmente poderíamos resumir tudo numa única palavra, e essa seria desespero. Não é, nem nunca foi uma imagem agradável. Mas regressemos rigorosamente ao início e àquela anedota inicial. Retratava a confusão que muitos soviéticos sentiam ao constatarem que as verdades de décadas tinham sido substituídas por factos e interpretações novas, impensáveis até aí, mas também a tentativa de manter a sanidade perante o novo quadro das coisas. Não corresponde à verdade, é claro. Doutra forma, os historiadores não teriam emprego, até porque é possível enganar muita gente, pelo menos durante algum tempo.
A narrativa do Estado de Israel — a quarta maior potência militar do Mundo — como vítima, logo no pleno direito de se defender da agressão, vinda de fora das suas fronteiras (?!!!), continua dominante. O mais provável é que vá continuar a sê-lo. Mas não para sempre. A minha falecida mãe costumava dizer (citando a minha avó materna, que não cheguei a conhecer): "A mentira tem perna curta, nunca consegue ir longe". A verdade acabará por chegar à Palestina.
No dia 21 de Novembro de 1709 morreu o escritor e compositor português António Marques Lésbio. Tinha nascido em Lisboa, em 1639.
Em 1668 foi mestre dos músicos de câmara do rei e, a partir daí, ocupou vários cargos na corte, incluindo o de chefe do coro. Uma figura importante na vida musical portuguesa, Lésbio passou a sua vida na cidade de Lisboa. Como escritor, publicou numerosos vilancicos espanhóis e portugueses e musicou a maioria deles. Mas só 16 sobreviveram. A maior parte das suas obras foi perdida devido ao terramoto de Lisboa de 1755.