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"Deficiente" é aquele que não consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive, sem ter consciência de que é dono do seu destino. Mario Quintana (escritor gaúcho, 30/07/1906 – 05/05/1994
No dia em que se assinala o 170.º aniversário do nascimento do poeta português, a homepage do Google Portugal celebra a sua carreira
Esta é a imagem que podemos ver hoje na homepage do Google Portugal, que decidiu homenagear Antero de Quental.
O poeta e escritor nasceu a 18 de abril de 1842 em Ponta Delgada, nos Açores, e foi uma das vozes mais marcantes do movimento Geração de 70, um movimento académico do século XIX que veio revolucionar a cultura portuguesa.
Além da sua obra literária, Antero de Quental foi ainda um dos fundadores do Partido Socialista Português e em 1869 fundou o jornal A República.
A 11 de setembro de 1849, tinha na altura 49 anos, o escritor suicidou-se na sua terra natal, mas a obra que deixou tornou-se marcante para a cultura portuguesa.
http://www.dn.pt/inicio/artes/interior.aspx?content_id=2427389&seccao=Livros
Vai aqui um extracto do célebre discurso proferido por Antero de Quental, numa sala do Casino Lisbonense, em Lisboa, no dia 27 de Maio de 1871, durante a 1.ª sessão das Conferências Democráticas.
“(...) Meus Senhores:
A decadência dos povos da Península nos três últimos séculos é um dos factos mais incontestáveis, mais evidentes da nossa história: pode até dizer-se que essa decadência, seguindo-se quase sem transição a um período de força gloriosa e de rica originalidade, é o único grande facto evidente e incontestável que nessa história aparece aos olhos do historiador filósofo. Como peninsular, sinto profundamente ter de afirmar, numa assembleia de peninsulares, esta desalentadora evidência. Mas, se não reconhecermos e confessarmos francamente os nossos erros passados, como poderemos aspirar a uma emenda sincera e definitiva? O pecador humilha-se diante do seu Deus, num sentido acto de contrição, e só assim é perdoado. Façamos nós também, diante do espírito de verdade, o acto de contrição pelos nossos pecados históricos, porque só assim nos poderemos emendar e regenerar.
Conheço quanto é delicado este assunto, e sei que por isso dobrados deveres se impõem à minha crítica. Para uma assembleia de estrangeiros não passará esta duma tese histórica, curiosa sim para as inteligências, mas fria e indiferente para os sentimentos pessoais de cada um. Num auditório de peninsulares não é porém assim. A história dos últimos três séculos perpetua-se ainda hoje entre nós em opiniões, em crenças, em interesses, em tradições, que a representam na nossa sociedade, e a tornam de algum modo actual. Há em nós todos uma voz íntima que protesta em favor do passado, quando alguém o ataca: a razão pode condená-lo: o coração tenta ainda absolvê-lo. É que nada há no homem mais delicado, mais melindroso, do que as ilusões: e são as nossas ilusões o que a razão crítica, discutindo o passado, ofende sobretudo em nós...
... Dera-se, com efeito, durante o século XVI, uma deplorável revolução nas condições económicas da sociedade portuguesa, revolução sobretudo devida ao novo estado de coisas criadas pelas conquistas. O proprietário, o agricultor, deixam a charrua e fazem-se soldados, aventureiros: atravessam o oceano, à procura de glória, de posição mais brilhante ou mais rendosa. Atraída pelas riquezas acumuladas nos grandes centros, a população rural aflui para ali, abandona os campos, e vem aumentar nas capitais o contingente da miséria, da domesticidade ou do vício. A cultura diminui gradualmente. Com essa diminuição, e com a depreciação relativa dos metais preciosos pela afluência dos tesouros do Oriente e América, os cereais chegam a preços fabulosos. O trigo, que em 1460 valia 10 réis por alqueire, tem subido, em 1520, a 20 réis, 30 e 35! Por isso o preço nos mercados estrangeiros, nem sequer pode cobrir o custo originário: a concorrência doutras nações, que produziam mais barato, esmaga-nos. Não só deixamos de exportar, mas passamos a importar: «Do reinado de D. Manuel em diante», diz Alexandre de Gusmão, «somos sustentados pelos estrangeiros.» Esse sustento podiam-no pagar os grandes, que a Índia e o Brasil enriqueciam. A multidão, porém, morria de fome. A miséria popular era grande. A esmola à portaria dos conventos e casas fidalgas passou a ser uma instituição. Mendigavam os bandos pelas estradas. A tradição, num símbolo terrivelmente expressivo, apresenta-nos Camões, o cantor dessas glórias que nos empobreciam, mendigando para sustentar a velhice triste e desalentada. É uma imagem da nação. As crónicas falam-nos de grandes fomes. Por tudo isto, decrescia a olhos vistos a população. Que remédio se procura a este mal? um mal incomparavelmente maior: a escravidão! Tenta-se introduzir o trabalho servil nas culturas, com escravos vindos da África! Felizmente não passou de tentativa. Era a transformação dum país livre e civilizado numa coisa monstruosa, uma oligarquia de senhores de roça! A barbaridade dos devastadores da América, transportada para o meio da Europa! Com estes elementos o que se podia esperar da indústria? Uma decadência total. Não se fabrica, não se cria: basta o ouro do Oriente para pagar a indústria dos outros, enriquecendo-os, instigando-os ao trabalho produtivo, e ficando nós cada vez mais pobres, com as mãos cheias de tesouros! Importávamos tudo: de Itália, sedas, veludos, brocados, massas; da Alemanha, vidro; de França, panos; de Inglaterra e Holanda, cereais, lãs, tecidos. Havia então uma única indústria nacional... a Índia! Vai-se à Índia buscar um nome e uma fortuna, e volta-se para gozar, dissipar esterilmente. A vida concentra-se na capital. Os nobres deixam os campos, os solares dos seus maiores, onde viviam em certa comunhão com o povo, e vêm para a corte brilhar, ostentar... e mendigar nobremente. O fidalgo faz-se cortesão: o homem do povo, não podendo já ser trabalhador, faz-se lacaio: a libré é o selo da sua decadência. A criadagem duma casa nobre era um verdadeiro estado. O luxo da nobreza tinha alguma coisa de oriental. Ao luxo desenfreado, ao vício, à corrupção, mal dista um passo. A paixão do jogo estendeu-se terrivelmente: jogava-se nas tavolagens, e jogava-se nos palácios. O ócio, acendendo as imaginações, levava pelo galanteio às intrigas amorosas, às aventuras, ao adultério, e arruinava a família. Lisboa era uma capital de fidalgos ociosos, de plebeus mendigos, e de rufiões (...)”
http://tertuliabibliofila.blogspot.pt/2010/11/antero-de-quental-causas-da-decadencia.html
Antero de Quental-discurso.pdf 165K Visualizar Transferência |
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