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Da Loucura

por Rogério Costa Pereira, em 10.06.12

É certo que "se eu quisessse, enlouquecia" ["Os Passos em Volta", Herberto Hélder]

Porém (agora sou eu), se um dia me virem não louco não digam que enlouqueci porque quis.

Enlouqueceram-me.

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publicado às 01:47

a faca não corta o fogo,
não me corta o sangue escrito,
não corta a água,
e quem não queria uma língua dentro da própria língua?
eu sim queria,
jogando linho com dedos, conjugando
onde os verbos não conjugam,
no mundo há poucos fenómenos do fogo,
água há pouca,
mas a língua, fia-se a gente dela por não ser como se queria,
mais brotada, inerente, incalculável,
e se a mão fia a estriga e a retoma do nada,
e a abre e fecha,
é que sim que eu amava como bárbara maravilha,
porque no mundo há pouco fogo a cortar
e a água cortada é pouca.
que língua,
que húmida, muda, miúda, relativa, absoluta,
e que pouca, incrível, muita
e la poésie, cést quand le quotidien devient extraordinaire, e que
_______________________________________música
que despropósito, que língua língua,
disse Maurice Lefèvre, e como rebenta na boca!
queria-a toda

Herberto Helder
A Faca Não Corta o Fogo
Assírio & Alvim, 2008

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publicado às 08:00

Gárgula.
Por dentro a chuva que a incha, por fora a pedra misteriosa
que a mantém suspensa.
E a boca demoníaca do prodígio despeja-se
no caos.
Esse animal erguido ao trono de uma estrela,
que se debruça para onde
escureço. Pelos flancos construo
a criatura. Onde corre o arrepio, das espáduas
para o fundo, com força atenta. Construo
aquela massa de tetas
e unhas, pela espinha, rosas abertas das guelras,
umbigo,
mandíbulas. Até ao centro da sua
árdua talha de estrela.
Seu buraco de água na minha boca.
E construindo falo.
Sou lírico, medonho.
Consagro-a no banho baptismal de um poema.
Inauguro.
Fora e dentro inauguro o nome de que morro.

Herberto Helder
Le poème continu
somme anthologique
Institut Camões / Chandeigne
Paris, 2002

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publicado às 08:00


Poesia ao nascer do dia - Herberto Helder -

por Luis Moreira, em 04.02.12

Com uma pêra, dou-lhe um nome de erro
entre mim e tudo, na mão, amadureço
enquanto ela se torna propícia,
amarela ao influxo do vento de estrela para estrela.
O sangue da mão ensombra a fruta na sua volta
de átomos, abala
imagem, arquitectura.
E o espaço que isto cria: a noite
aparece no ar. E dura, leve, tersa, curva,
a linha
do fogo entrecruza
os pontos paralelos: a pêra desde o esplendor,
a mão desde
o equilíbrio, os centros
do sistema geral do corpo, o buraco negro.
Morro?
Escrevo apenas, e o hausto aspira
dedos e pêra, enigma e sentido, ordem, peso, o papel onde assenta
a constelação do mundo com esse buraco
negro e as palavras em torno.
No instante extremo de
desaparecerem.
Se morro, é por exemplo.

Herbertohelder
Do Mundo
Assírio & Alvim, 1994

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publicado às 08:00

"O assunto do bailarino" de Herberto Hélder

por Luiz Antunes, em 25.11.10

Fotografia: Magda Fernandes

 

Afinal a ideia é sempre a mesma o bailarino a pôr o pé

No sítio uma coisa muito forte

Na cabeça no coração nos intestinos no nosso próprio pé

Pode imaginar-se a ventania quer dizer

“o que acontece ao ar” é a dança

pois vejam o que está a fazer o bailarino que desata por aí fora

(por “aí dentro” seria melhor) ele varre o espaço

se me permitem varre-o com muita evidência

somos obrigados a ver “isso”

que faz o pé forte no sítio forte o pé leve no sítio leve

o sítio rítmico no pé rítmico?

E digo assim porque se trata do princípio “de cima para baixo

De baixo para cima”

Que faz? Que fazem? Oh apenas um pouco de geometria

Em termos de tempo um pouco de velocidade

Em termos de espaço dentro do tempo

“vamos lá encher o tempo com rapidez de espaço”

pensam os pés dele quando o ar está pronto

o “problema” do bailarino é coisa que não interessa por aí além

mas são chegados os tempos de agonia

estamos “exaltados” com este pensamento de morte

é preciso pensar no “ritmo” é uma das nossas congeminações exaltadas

na realidade algo se transformou desde que ele começou a dançar

sem qualquer auxílio excepto

não haver ainda nomes para “isso” e haver os ingredientes

do espectáculo i.e. a qualidade “forte” do sítio

e pés

esperem pela abertura de negociações entre “não” e “sim”

hão-de ver como coisas dessas se passam

não vai ser fácil os recursos de designação as acomodações várias

já se não encontram às ordens de vossências

comecem a aperceber-se da “energia” como “instrumento”

de criar “situações cheias de novidade”

vai haver muito nevoeiro nessas cabeças

e ainda “o coração caiu-lhe aos pés” o banal

a contas com o inesperado talvez então se tenha a ideia de murmurar

“os pés subiram-lhe ao coração”

pois vão dizendo que exagero logo se verá

também Jorge Luís Borges escreveu esta coisa um nadinha espantosa

“a lua da qual tinha caído um leão” nunca se pode saber

maçãs caem Newton cai na armadilha

quedas não faltam umas por causa das outras

os impérios caem etc. o assunto do bailarino cai

mas sempre em cima da cabeça e estamos para ver

Cristo a andar sobre as águas é ainda o caso do bailarino

“o estilo”

claro que “isto” apavora

a dança faz parte do medo se assim me posso exprimir

 

Herberto Hélder


 

 

 

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publicado às 05:15


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